Liberdade e Transporte

O UBER e a vida nas cidades

Existem várias discussões no Brasil seja por pesquisadores ou pelos legisladores sobre o impacto do UBER (e os demais aplicativos ne mobilidade) na vida cotidiana das cidades. E as reflexões indubitavelmente caminham para a tentativa de regulação estatal por meio da criação de uma série de restrições e limitações para os aplicativos de mobilidade.

Vejam como exemplo o que ocorreu na Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados que felizmente rejeitou, o projeto de lei que limitava a parcela cobrada de motoristas pelos aplicativos de transporte. Atualmente, empresas como Uber e Cabify ficam com faixas entre 20% a 25% do total cobrado de usuários na corrida (a média da 99 é de 15%). O PL 448/19 busca reduzir artificialmente esta taxa para 10%. O texto foi analisado pela comissão e rejeitado por 18 votos contra e seis a favor. Os principais argumentos são de que o limitante caracteriza uma intervenção pública em uma empresa privada, o que fere a diretriz constitucional da livre iniciativa e livre concorrência.

Outro exemplo foi em relação ao MetraClass, serviço de ônibus de alto padrão solicitado pelo aplicativo Ubus, que foi impedido de circular na cidade de São Paulo pois a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, classificou como transporte clandestino.

Veja o pensamento do secretário de mobilidade e transportes da capital paulista, Edson Caram, proferido na  abertura do congresso Arena ANTP, da Associação Nacional de Transportes Públicos dias antes da decisão.

“A fiscalização e controle dos novos modais está entre as prioridades da cidade de São Paulo, juntamente com a redução dos acidentes e o estímulo aos deslocamentos não motorizados e ao transporte coletivo. É um desafio que não só a cidade de São Paulo tem, mas todas aquelas que têm a meta de organizar os deslocamentos” disse

Infelizmente fica claro que o pensamento do bem estar dos indivíduos que residem na cidade não são de interesse deste agente público e em nome de uma “coletividade” ele se coloca como aquele que tem condições de saber quais são as melhores escolhas para população paulistana.

No mesmo evento o presidente da ANTP, Ailton Brasiliense, enfatizou que, mesmo com novas modalidades que têm surgido, o foco das políticas públicas deve ser o transporte coletivo, caso contrário, as cidades podem sofrer ainda mais com o trânsito e a poluição:

“Não se perder o foco no transporte coletivo. Uma gestão inteligente das cidades deve criar estímulos e condições para que os deslocamentos utilizem da melhor forma o espaço urbano. Não há outro caminho  para isso a não ser o coletivo”. disse

Quem também está preocupado com crescimento do transporte por aplicativos, principalmente os de carros, são os operadores de transporte público que dizem perder passageiros, em especial nos deslocamentos mais curtos que, pelo modelo tarifário na maior parte do País, financiam as viagens mais longas e as gratuidades.

“Estamos diante de novos tempos e precisamos ter respostas rápidas, tanto setor privado como poder público, sob pena de o transporte individual ter prevalência maior sobre transporte coletivo. São tempos de ameaças à mobilidade, mas também de oportunidade para revermos nosso papel e forma de atuação” – afirmou presidente do SPUrbanuss, Francisco Christovam.

Fica claro portanto que tanto o agente público, quanto o que representa os pesquisadores quanto os atuais empresários do transporte público, negligenciaram o economista austríaco Ludwig Von Mises que escreveu com enorme clareza na primeira metade do século passado e que até nos dias de hoje é uma verdade irrefutável – a decisão do consumidor (individuo) é mais poderosa e verdadeira que qualquer lei pois ela:

Um exame superficial poderia nos levar a imaginar que são os empresários que decidem o que deve ser produzido e como deve ser produzido. Entretanto, como eles produzem não para satisfazer suas próprias necessidades, mas para atender a necessidades de terceiros, é preciso que seus produtos sejam vendidos, no mercado, aos consumidores, ou seja, para aqueles que desejam consumi-los. Assim sendo, o empresário só poderá ser bem-sucedido e realizar um lucro se for capaz de produzir melhor e mais barato, vale dizer, com um menor dispêndio de material e mão de obra, os artigos mais urgentemente desejados pelos consumidores. Portanto, são os consumidores e não os empresários que determinam o que deve ser produzido. Numa economia de mercado o consumidor é o soberano. É ele que manda, e o empresário tem que se empenhar, no seu próprio interesse, em atender seus desejos da melhor maneira possível. A economia de mercado tem sido denominada democracia dos consumidores, por determinar através de uma votação diária quais são suas preferências. (Intervencionismo, uma análise econômica. Tradução de Donald Stewart Jr. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010)

Voltando a questão referente a limitação da comissão cobrada pelos aplicativos de mobilidade o autor do projeto de lei, o deputado federal Igor Timo (Podemos-MG), ressaltou a precariedade da relação de trabalho entre empresas e prestadores do serviço. Tal relação que é sabidamente inexistente.

Apoiadores da iniciativa os representantes de quatro associações de motoristas de aplicativos que estavam presentes no dia da audiência pública relataram as dificuldades em ter uma renda compatível com jornadas de até 16 horas diárias de trabalho. Bismarck Hegermann, um dos porta-vozes da categoria, mostrou uma planilha com os ganhos de 20 viagens feitas no dia anterior e acrescentou que falta transparência na definição do percentual cobrado pelas plataformas de aplicativos. Mas também não revelou os motivos de não buscarem outros fornecedores ou desenvolverem o seu próprio aplicativo.

Já a representante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Patricia Sakowski,foi muito feliz ao se posicionar contra o projeto de lei, porque ela entendeu que a limitação na taxa das empresas poderia provocar aumento de preços das corridas, diminuição da demanda de trabalho para os motoristas, redução de investimentos em inovação e desestímulo à entrada de novos concorrentes no mercado.

Sendo assim, fica claro que mesmo se nosso dia a dia, tenhamos contato com várias ideias inovadoras, projetos e práticas. E que infelizmente, da mesma forma que nos deparamos com essas ideias em nossa rotina, também encontramos várias barreiras que impedem que elas sejam colocadas em prática, como por exemplo, burocracia, falta de recurso, capital intelectual insuficiente, entre outros. Além desses três aspectos que, de fato, impõem barreiras em alguns projetos inovadores, existe outro ponto que é pouco explorado – a regulação.

O Brasil é e sempre foi um dos países mais regulados do mundo, embora se pense que a regulação seja uma novidade no Estado brasileiro trazida pelo governo tucano do FHC. Em relação a esse assunto, Abranches (1999,) destaca:

“na trajetória histórica da formação do setor público brasileiro fica evidente a existência de um grande número de empresas públicas, estatais, sociedades de economia mistas, autarquias e demais órgãos governamentais exercendo, em alguma extensão, um tipo de regulação. Tal regulação pode, também, ser compreendida como uma forma de intervenção do poder público em setores com alguma relevância para o desenvolvimento econômico e social. Então, pode-se inferir que a regulação sempre esteve voltada para alguns setores da economia, merecedores de maior atenção da função regulatória.”

No entanto, a regulação brasileira sempre esteve atrelada, politicamente, como um instrumento político que poderia ser utilizado como moeda de troca entre o Estado, suas elites e os grupos de interesses que sempre buscaram ganhos privados junto ao Estado.

E em relação aos aplicativos de mobilidade, os reguladores estão buscando o melhorar realmente a qualidade de vida das pessoas. Ou estão fazendo simplesmente a velha política reguladora?

É importante ressaltar que em Goiânia a operadora HP Transportes em parceria com o ente gestor do sistema a CMTC lançaram no início de 2019 um serviço por aplicativo integrado ao sistema local de transporte coletivo, denominado de Citybus 2.0. E este parece ser o caminho no curto prazo mais correto: buscar alianças estratégicas entre o poder público, operadores públicos, operadores privados e aplicativos de mobilidade com objetivo de oferecer um único serviço integrado para e centrado nas pessoas que portanto terão o poder de escolher a melhor forma, de acordo com a sua necessidade individual, de se deslocar entre os pontos A e B.

Aqui deixo algumas frase para refletirmos em relação a regulação dos aplicativos de mobilidade:

  • Não há nenhuma maneira de medir a qualidade e o sucesso de um produto pelo qual os consumidores são forçados a pagar. Murray Rothbard
  • O governo é bom em uma coisa. Ele sabe como quebrar as suas pernas apenas para depois lhe dar uma muleta e dizer: “Veja, se não fosse pelo governo, você não seria capaz de andar!” Harry Browne
  • A humanidade precisa, antes de tudo, se libertar da submissão a slogans absurdos e voltar a confiar na sensatez da razão. Ludwig von Mises
  • Na economia de mercado não há outro meio de adquirir e preservar a riqueza, a não ser fornecendo às massas o que elas querem, da maneira melhor e mais barata possível. Ludwig von Mises
  • O objetivo final da ação é sempre a satisfação de algum desejo do agente homem. Só age quem se considera em uma situação insatisfatória, e só reitera a ação quem não é capaz de suprimir o seu desconforto de uma vez por todas. O agente homem está ansioso para substituir uma situação menos satisfatória por outra mais satisfatória. Ludwig von Mises
  • Se alguém rejeita o laissez faire por causa da falibilidade do homem e fraqueza moral, deve-se pela razão também rejeitar cada tipo de ação governamental.“ — Ludwig von Mises
  • Inovar ou morrer – Edmundo Pinheiro

 

Como sempre, Miguel Ângelo mostra sua lucidez e capacidade de apresentar ideias que mais que explicar, nós levam a novos questionamentos.