Liberdade e Transporte

A crise do Sistema de Transporte Público Urbano pelo prisma do Liberalismo

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O sistema de transporte público coletivo de passageiros, no Brasil com um todo, apresenta neste momento, uma das piores crises da sua história, resultante de duas situações de difícil e relativamente demorada superação, sendo uma de ordem estrutural (relacionado a estrutura do Estado) e outra de ordem conjuntural (relacionado a atual crise econômica). Neste artigo abordaremos a crise estrutural utilizando como luz à discussão pensamentos de dois importantes ícones do pensamento Liberal: Friedrich August von Hayek e Ludwig von Mises.

A crise estrutural começa pela forma de intervenção do Estado no Sistema de Transporte, onde o mesmo determina a tarifa, o planejamento, a forma de operação, os benefícios tarifários e a organização. Entretanto o Estado é omisso em relação a infraestrutura desejável para o pleno funcionamento do serviço, isto é, ele não investe e nem repassa para iniciativa privada os investimentos.

A infraestrutura ineficiente provoca a diminuição da qualidade (principalmente relacionada ao tempo de viagem e pontualidade); a diminuição da qualidade implica na perda de usuários pagantes, que gera redução de receita e que produz aumento do custo médio por passageiro transportado; essas perdas geram queda de produtividade e rentabilidade do sistema; essa queda resulta em desequilíbrio financeiro que provoca aumento da tarifa; o desequilíbrio financeiro resulta em perda de qualidade e atratividade do transporte coletivo, que por isto perde demanda, retroalimentando o Círculo Vicioso.

Outro fator que potencializa o Círculo Vicioso é o custo repassado para a tarifa pelos benefícios tarifários, como por exemplo as gratuidades (idosos, deficientes, crianças, carteiros, dentre outros) e a meia-passagem dos estudantes. Aí reside a grande perversidade, pois quem acaba pagando a grande parte do benefício concedido são pessoas de baixa renda, usuários cativos do transporte público.

Segundo Hayek: “Quase que por uma lei da natureza humana, parece ser mais fácil aos homens concordarem sobre um programa negativo – o ódio a um inimigo ou a inveja aos que estão em melhor situação – do que sobre qualquer plano positivo“(1) No Sistema isto fica clara em momentos de reajuste tarifário no qual a população de forma geral e a imprensa se pautam mais em questionar os novos valores aplicados do que entender o real problema e quais seriam as ações para solucionar ou mitigar alguns problemas.

É o discurso fácil de ódio ao lucro: “A geração de hoje cresceu num mundo em que, na escola e na imprensa, o espírito da livre iniciativa é apresentado como indigno e o lucro como imoral, onde se considera uma exploração dar emprego a cem pessoas, ao passo que chefiar o mesmo número de funcionários públicos é uma ocupação honrosa“(2)   (Hayek). Aqui temos a base dos discursos atuais em relação ao transporte público no qual o cerne de todos os problemas do transporte público reside no lucro dos operadores. Nunca se discutiu em como a inciativa privada poderia ser mais efetiva com a não intervenção total do Poder Público.

“Se, a longo prazo, somos criadores do nosso destino, de imediato somos escravos das ideias que criamos”(3) Esta frase do Hayek pode ser aplicada nas decisões populistas dos governantes que em 2013 como reação as manifestações populares decidiram em conjunto com o governo federal o congelamento das tarifas nas principais cidades do país. Tal movimento fez com que as empresas perdessem a capacidade de poupar comprometendo os investimentos futuros. Esta intervenção governamental repercute até hoje provocando o sucateamento e precarização dos serviços nos principais centros urbanos. E assim como aconteceu com a redução forçada da energia elétrica o congelamento das tarifas de ônibus provocou um forte aumento nos preços nos anos seguintes e sem ser acompanhado pelos investimentos uma vez que não foi gerado a poupança necessária para tal.

“Ninguém pode ser chamado para estabelecer o que é necessário para que alguém seja feliz“ (4) (Mises) Outro equívoco do nosso pois quem faz o design do Sistema de Transporte são os burocratas ou os tecnoburocratas e não os usuários do serviço. É o governo que determina a tipologia da frota, as tecnologias embarcadas, a forma de distribuição das viagens. E na maioria das vezes são atendidos os anseios de políticos (vereadores, líderes de bairro…) e não a real necessidade dos indivíduos que utilizam ou gostariam de utilizar o serviço. Aqui é interessante ressaltar que devemos parar de enxergar o individua como um extrato da sociedade e sim perceber a sociedade como a somatório de desejos individuais.

E por último – “O progresso é precisamente aquilo não previsto pelas regras e regulamentos“ (Mises). O Sistema de Transporte Público Urbano só conseguirá sair desta crise quando o modelo atual for destruído. É necessário, portanto uma solução desruptiva no qual o sistema possa ser mais flexível/liberal e que o prestador e o usuário do serviço sejam os reais responsável pelo planejamento, operação e pagamento. E ao Estado caberá a função de garantir as necessidades básicas como por exemplo a segurança, mas isso será assunto para outro artigo.

(1) Por que os piores chegam ao poder – http://mises.org.br/ArticlePrint.aspx?id=1443

(2) Segurança versus liberdade – ansiar pela primeira pode nos deixar sem a segunda – http://mises.cc/ArticlePrint.aspx?id=1671

(3) O Caminho da Servidão – http://www.mises.org.br/files/literature/O%20CAMINHO%20DA%20SERVID%C3%83O%20-%20WEB.pdf

(4) Ação Humana – Um Tratado de Economia – http://www.mises.org.br/files/literature/A%C3%A7%C3%A3o%20Humana%20-%20WEB.pdf

(5) O papel do marketing no livre mercado – http://www.mises.org.br/ArticlePrint.aspx?id=336